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24/01/2019

Sexualidade do autista: como ela acontece?

sexualidade e autismo

A sexualidade do autista pode ser um tabu. O assunto por si só nem sempre é tratado abertamente pelas famílias, tornando-se ainda mais complicado quando envolve jovens com Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Eu, como professor de Educação Física, atendo muitos adolescentes. Volta e meia este assunto é comentado pelos pais como uma grande preocupação.

Além da dificuldade de falar sobre a sexualidade do autista, muitos pais não sabem como proceder, como lidar e como orientar seus filhos.

Por isso, achei importante tratar o tema sexualidade do autista aqui no blog.

Para comentar com mais propriedade esse assunto, convidei a Marina Almeida, que é Psicóloga Clínica e Escolar, Pedagoga Especialista, Psicopedagoga Clínica e Institucional, Neuropsicóloga e Consultora em Educação Inclusiva do Instituto Inclusão, em São Vicente, São Paulo.

A primeira coisa que ela enfatiza é que o tema sexualidade é mais que sexo. É a maneira como os jovens com TEA e neurotípicos (sem diagnóstico de TEA) se sentem em relação ao corpo em desenvolvimento, às mudanças hormonais, às características da sexualidade, aos lutos de passagem da infância para adolescência, aos afetos e ao estabelecimento de vínculos amorosos.

“Os sentimentos sexuais são normais e existem muitas maneiras de expressá-los. Se uma pessoa tem uma deficiência, isso não muda nada. O que muitas vezes muda é a socialização que fornece a base para a identidade sexual”, explica Marina.

Os desafios de falar sobre a sexualidade do autista

Marina enfatiza que é essencial que os pais não fiquem envergonhados ao falar de sexualidade, sexo e masturbação.

A sexualidade é uma parte normal do ser humano. O jovem com TEA muitas vezes tem dificuldades em entender questões sobre intimidade e independência sexual, atração e afeição pelos outros, relacionamentos respeitosos, diferença entre público e privado, como abordar alguém, métodos contraceptivos e prevenção das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs).

“Deixo claro que os adolescentes com TEA desenvolvem-se sexualmente da mesma forma que os outros adolescentes, mas vão precisar de orientação sexual para lidar com as habilidades sociais e a maturidade que acompanham a sexualidade”, lembra a especialista.

Portanto, a orientação da Marina é começar a falar do assunto já a partir dos três anos de idade, de forma a incluir o papo naturalmente na rotina. Procure também usar os nomes corretos das partes do corpo, sem infantilizar, e recorra a livros sobre o assunto.

Sexualidade do aitista

A psicoterapeuta deixa outra dica importante: “Comece a ensinar sexualidade cedo pensando adiante. Ou seja, pode ser fofo deixar uma criança em idade pré-escolar correr nua pela casa, mas esse hábito precisa ser quebrado à medida que ela se desenvolve e se torna um jovem.”

Os pais não podem esperar que as escolas façam esse papel, porque muitas vezes o tema se restringe ao estudo do órgão reprodutor em disciplinas de Biologia ou Ciência, deixando de lado as angústias da sexualidade do autista.

As consequências da infantilização na sexualidade do autista

Por apresentar dificuldades quando comparados às pessoas neurotípicas, é comum que os pais tratem os autistas eternamente como crianças, mesmo quando eles já têm uma certa idade.

Esse comportamento é inadequado e, como lembra Marina, compromete a sexualidade do autista e os desenvolvimentos psíquico, maturacional, afetivo e social, porque os pais acabam criando jovens que não terão a oportunidade da construção de um projeto de vida e serão eternamente infantis.

“Isso pode aprisionar o filho com TEA numa eterna repressão da sexualidade. Por consequência, encontraremos inúmeros jovens autistas apresentando problemas na expressão da sexualidade, com comportamentos disruptivos, surtos psicóticos, sexualidade inapropriada, masturbação compulsiva, depressão, agressividade, comportamentos autolesivos, aumento de estereotipias etc.”, alerta Marina.

Nesses casos em que o adolescente apresentar esses comportamentos, é importante a participação de um psicoterapeuta para ajudar na redução dos conflitos de superproteção, medos, angustias, conflitos pessoais e enfrentamento dos tabus do sistema de funcionamento familiar.

Dá para ensinar um autista a se relacionar?

sexualidade no autismo

Nem todos os relacionamentos românticos precisam ser sexuais ou durar por longos períodos, e esses pontos precisam ser esclarecidos para os jovens com TEA.

Mas não é só isso. Uma vez que a interação social é um desafio para as pessoas com autismo, expressar sentimentos de intimidade e afeto, como beijo e abraço, e entender as intenções do outro podem ser situações desafiadoras.

Por isso, os pais precisam construir a confiança e autoestima do filho com TEA para relacionamentos românticos e íntimos.

Nesse processo, devem estar preparados para responder a questões como: “Como faço para ter uma namorada/namorado?” ou “Como você beija alguém?”. Perguntas deste tipo podem ser uma ótima oportunidade para ajudar o jovem com TEA a entender seus sentimentos e se comportar de maneira apropriada.

Os pais podem ainda aproveitar o momento para usar histórias sociais, livros e fotos para explicar como o corpo reage quando uma pessoa sente atração por outra, como a pessoa se comporta ao nutrir sentimentos românticos por alguém e como interpretar esses sentimentos.

Para que não haja risco de o jovem fazer coisas inadequadas ou arriscadas ou, ainda, entrar em relacionamentos não saudáveis, Marina alerta que é importante os pais orientarem seus filhos sobre os conceitos de consentimento e segurança.

“O consentimento significa que seu filho precisa ter certeza de que se sente bem com qualquer tipo de experimentação sexual e que a outra pessoa também está de acordo com isso. E a segurança significa que seu filho e a outra pessoa estão protegidos contra gravidez e infecções sexualmente transmissíveis, e que a experiência é respeitosa e não violenta”, esclarece.

Ao explicar bons e maus sinais em um relacionamento, por meio de imagens, histórias e exemplos falados, os pais ajudam a desenvolver relacionamentos saudáveis e mais amigáveis. “Como os adolescentes com TEA podem ter dificuldade em compreender as regras sociais, as palavras das pessoas ou a linguagem corporal, eles podem acabar respondendo inadequadamente. Por isso, muitas vezes precisam de explicações claras sobre o que é apropriado e o que não é”, comenta Marina.

A especialista lembra que essa orientação também é importante para esclarecer ao jovem a diferença de um relacionamento saudável de um abuso sexual. Para isso é importante ajudá-los a identificar situações de risco, como alguém que não é namorado(a) tocar de maneira desconfortável em áreas privadas, que bate, que força o beijo.

“É importante ajudar os jovens com TEA a entenderem que, se alguém está tentando convencê-los a fazer algo sem respeitar seus sentimentos ou desejos, a resposta mais segura é ‘não’.”

Maria encerra lembrando que a melhor educação sexual que os pais podem oferecer para seus filhos com TEA é aquela ligada ao afeto, ao respeito e à confiança. “É essencial superar tabus e ajudar esses jovens a terem a plena consciência das habilidades sociais, limites, cuidados sexuais e privacidade, pois são os pontos mais relevantes para uma vida sexual saudável.”

Gostou do nosso artigo sobre sexualidade do autista? Espero que sim! Quero agradecer muito a Marina Almeida pelos esclarecimentos e contribuição tão importante!

Caso haja algum assunto relacionado ao autismo que você tenha dúvidas, use o espaço dos comentários para deixar sua sugestão e fique à vontade para compartilhar nossos materiais nas redes sociais!

Para ver nossos outros artigos, clique aqui.

10 Comments on “Sexualidade do autista: como ela acontece?

Joelma
25/01/2019 em 01:17

Muito esclarecedora a explicação.

Responder
Esporte e inclusão
12/06/2020 em 14:15

Muito obrigado!

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Dirceu Ferreira
27/01/2019 em 14:39

Obrigado pelo esclarecimento bastante oportuno e, se possível, aprofundem mais o tema! é sembre bem-vinda toda a ajuda que tivermos a esse respeito!

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Esporte e inclusão
12/06/2020 em 14:15

Muito obrigado Dirceu

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Ângela Carneiro
27/01/2019 em 17:31

Tenho um filho autista, está com 21 anos. Sempre tive a preocupação de não infantilizar. Porém sua idade mental não é compatível com a idade biológica. Não despertou absolutamente nada pra vida sexual. Fui desaconselhada a estimular. Mas tenho receios de que as crises de frustração dele possam estar relacionada a ausência de sexualidade.

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Esporte e inclusão
12/06/2020 em 14:18

Ângela, atuo em muitas equipes de profissionais e quase todas as equipes tem as psicólogas e sempre que a pessoa com tea chega nessa fase, tanto a família como a equipe recebem orientações das psicólogas para lhe dar da melhor forma com alguns comportamentos.

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Alda alves
17/03/2019 em 01:08

Como proceder com um jovem autista que não fala, e agora na adolescência com 15anos, se masturba sem noção do que seja. Quando a gente ver, já está todo sujo! Preocupante isso, sem saber como lidar😢

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Esporte e inclusão
12/06/2020 em 14:22

Alda, realmente essa fase é muito complicada, por experiência como professor de educação física e de trabalhar há mais de 10 anos em parceria com as psicólogas, sempre que atuo com as pessoas que chegam na fase da adolescência, busco orientações com.elas. A minha dica é que você procure orientações com.uma psicóloga que te orientará da melhor forma possível

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fernado
14/05/2019 em 09:39

Muito bom seus artigos parabens pelos conteudo

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Esporte e inclusão
12/06/2020 em 14:22

Muito obrigado Fernando

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